JOVENS
NO PODER

"O futuro está em aberto ele não existe, existe o presente e ele está em disputa, está em disputa.”

Wesley Teixeira, 26 anos,
candidato a vereador em Duque de Caxias (RJ)

As eleições de 2022 estão chegando depois de quase dois anos de pandemia da Covid-19. Os jovens participaram ativamente das ações de enfrentamento às consequências da pandemia e também serão atores/atrizes cruciais para decidir a próxima disputa presidencial. Não abrirão mão de um futuro mais consciente, estando sempre atentas e atentos às mudanças climáticas, às desigualdades sociais e aos movimentos de equidade de gênero.  

A política é exercício de futuro. E se as/os jovens são o futuro que tanto desejamos, que tal olharmos para as suas ações no presente? As juventudes brasileiras têm protagonizado imensas mudanças sociais e culturais em nosso país. Isso é visto nas redes e nas ruas. E na política? Como jovens inovadores estão ocupando os espaços institucionais e eleitorais para redesenhar os rumos da política? 

Nosso objetivo com este estudo é mostrar para você como jovens lideranças políticas, espalhadas pelo Brasil, viram, na política institucional e eleitoral, uma ferramenta de transformação social coletiva e democrática. Com experiências e práticas inovadoras, que surgem das diferentes vivências, queremos dar visibilidade à política do agora: se é possível imaginar uma política mais positiva, também é possível criá-la. E, se os jovens são o futuro, é preciso colocá-los no centro do debate, reconhecendo a potência que essa categoria social tem de desenvolver imaginários políticos que fortalecem a democracia com ética e justiça social.

Têm duas perguntas que há alguns anos me movem e justificam boa parte das minhas ações. Uma delas é: como a gente faz para acabar com o sofrimento humano? Mais especificamente: como fazemos para que a expectativa de vida das pessoas negras seja mais ou menos a mesma expectativa de vida de pessoas brancas? Como a cor da pele deixa de influenciar na expectativa de vida das pessoas? Essas duas perguntas, sem dúvidas, são as que eu faço todos os dias e enxergo a política como uma das ferramentas mais importantes para resolver esse problema.

Samuel Emílio, 26 anos,
candidato a vereador em São Paulo

Estamos passando por momentos complexos, de crises generalizadas, principalmente na democracia. Exercitar diariamente a nossa imaginação política é uma das formas de não cairmos em projetos autoritários e que ameaçam retirar todos os direitos conquistados. Ao invés de falar que não temos lideranças preparadas, fomos atrás de pessoas que estão escrevendo novas possibilidades de enredo para a história da política: jovens ativadores de futuros, que conduzem transformações estruturais na cultura política e na participação social. 

A inovação política ainda é um fenômeno recente no Brasil. Isso traz uma importância a mais para a visibilidade dos jovens na ocupação do poder: as juventudes, em sua maioria nascidas no pós-redemocratização, cresceram em anos de instabilidade política, com crises democráticas testando a capacidade de mobilização social e com a era digital, que reconfigura as formas de participação política e social. Esses dois pontos são importantes para se pensar e construir maneiras diferentes de fazer política.

Com a democracia sendo disputada por governos populistas e antidemocráticos, a aceleração das mudanças por meio da tecnologia digital e os desafios da pandemia da Covid-19, que evidenciam ainda mais as desigualdades sociais, as jovens lideranças podem ser elos condutores de transformações vitais para o futuro das democracias. Com o empoderamento das juventudes conscientes da importância de se construir a partir dos direitos conquistados, somado ao entendimento da tecnologia como meio para transformações democráticas, há possibilidades reais de desestabilizar as elites que governam há tempos e promover futuros com olhares mais transversais, intergeracionais e sustentáveis.

 

A urgência do presente depende de ações mais robustas e mudanças estruturais.

Por isso, os jovens inovadores na política enxergam um novo patamar de atuação: a ocupação do poder institucional como possibilidade de (re)imaginar o presente e o futuro da democracia. Disputar os espaços de poder é, para esses jovens, transformar causas sociais em políticas públicas e agendas que possam solucionar os problemas que os afetam de forma transversal, interseccional e a longo prazo.  O presente e o futuro estão muito próximos e os jovens estão sentindo isso na pele.

A pesquisa #JovensNoPoder redesenhando o rumo da política  identificou protagonistas, linguagens, práticas de inovação política e desafios da participação de jovens na política institucional no Brasil. Ao dar visibilidade a este ecossistema de novas e jovens lideranças inovadoras comprometidas com o resgate da confiança na política,  reconhecemos as juventudes como sujeitos políticos capazes de alterar lógicas de poder que limitam a visão positiva e transformadora da política. Ao mesmo tempo, oferecemos à sociedade brasileira, um leque de possibilidades de imaginar a política com perspectivas atualizadas, plurais, diversas e colaborativas para o enfrentamento dos desafios atuais. 

 

Sem tempo, irmão!

“Era um momento muito delicado que a gente não poderia perder a oportunidade. No mais, o fator estratégico de poder contribuir com nosso povo, com a nossa população. Trazer os recursos, as demandas, representar as leis e fazer com que as coisas valham de fato e não só fiquem só no escrito. A gente vê a potência que é ter um vereador indígena assim de qualquer localidade de qualquer representatividade, dentro da câmara, para defender, para falar pela luta”

Lennon Corezomae, 31 anos
vereador eleito em Barra do Bugres (MT)

Jovens, assim como mulheres, pessoas negras e LGBTQIA+ são uns dos grupos mais vulneráveis socialmente no Brasil. E quando as camadas sociais de gênero, cor/raça e classe se juntam, as realidades ficam mais desiguais. 

23% dos desempregados atuais no Brasil são jovens de 16 a 29 anos - IPEA (2021)

23% dos desempregados atuais no Brasil são jovens de 16 a 29 anos - IPEA (2021);

Os que mais perderam a renda foram os jovens entre 15 a 19 anos - Atlas das Juventudes (2021)

Os que mais perderam a renda foram os jovens entre 15 a 19 anos - Atlas das Juventudes (2021);

Com pandemia, 43% dos estudantes já pensaram em desistir dos estudos - Atlas das Juventudes (2021)

Com pandemia, 43% dos estudantes já pensaram em desistir dos estudos - Atlas das Juventudes (2021);

Há um aumento de desigualdade de 3,8% entre os jovens, contra 2,7% do conjunto da população - Atlas das Juventudes (2021)

Há um aumento de desigualdade de 3,8% entre os jovens, contra 2,7% do conjunto da população - Atlas das Juventudes (2021).

Em relação à política institucional e eleitoral, jovens estão sub-representados e, quando um segmento populacional tão grande e potente não está sendo representado, isso é um grande ataque à democracia. 

Jovens latino-americanos, de 16 a 24 anos, fazem parte do grupo que menos apoia a democracia -  Latinobarômetro (2021)

Jovens latino-americanos, de 16 a 24 anos, fazem parte do grupo que menos apoia a democracia -  Latinobarômetro (2021);

Ao todo, 232 jovens indígenas com menos de 30 anos se lançaram na disputa eleitoral em 2020 - TSE (2020)

Ao todo, 232 jovens indígenas com menos de 30 anos se lançaram na disputa eleitoral em 2020 - TSE (2020);

Ao todo, 232 jovens indígenas com menos de 30 anos se lançaram na disputa eleitoral em 2020 - TSE (2020);

Ao todo, 232 jovens indígenas com menos de 30 anos se lançaram na disputa eleitoral em 2020 - TSE (2020);

Pouco mais de 1 milhão de eleitores entre 16 e 17 anos estiveram aptos a votar, em 2020. Número 55% menor que 2016. Esses jovens representam 0,7% do eleitorado, contra 1,6% na última eleição municipal -  TSE (2020)

Pouco mais de 1 milhão de eleitores entre 16 e 17 anos estiveram aptos a votar, em 2020. Número 55% menor que o contabilizado em 2016. Esses jovens representam 0,7% do eleitorado, contra 1,6% na última eleição municipal -  TSE (2020);

53% dos jovens que responderam à pesquisa “Juventudes e a Pandemia” acreditam que estão mais atentos à política por conta da pandemia e 72% acreditam que a pandemia vai influenciar a forma como votarão em 2022 - Juventudes e a Pandemia (2021)

53% dos jovens que responderam à pesquisa “Juventudes e a Pandemia” acreditam que estão mais atentos à política por conta da pandemia e 72% acreditam que a pandemia vai influenciar a forma como votarão em 2022 - Juventudes e a Pandemia (2021).

Todos esses dados mostram o quanto é necessário fortalecer a imaginação política com referências e práticas positivas que possam resgatar a confiança das pessoas, principalmente dos jovens, nas instituições políticas. 

Queria propor alguma coisa para o futuro. A gente tava no momento com pouca perspectiva de futuro, uma visão da elite muito voltada para o atraso, voltada para a ditadura, para escravidão, e a gente queria compartilhar um pouco desse conhecimento que a gente teve, da vivência com o povo e das experiências com o povo. E aí a gente percebeu que, para manter isso, a gente precisava institucionalizar. Isso passava por uma estratégia de disputa de poder.

Wesley Teixeira, 26 anos,
candidato a vereador em Duque de Caxias (RJ).

Sabemos que não será em quatro anos que as desigualdades brasileiras deixarão de existir, mas sim a partir de novas práticas e formas criativas de fazer a política, com continuidade. E isso dependerá de um trabalho constante de imaginação para que as gerações atuais e as próximas reconheçam, na política institucional e eleitoral, caminhos  fundamentais para a redução das desigualdades sociais, econômicas, ambientais e raciais.

 Jovens inovadores demarcam o espaço político, constroem mais pontes do que muros,  debruçam-se em valores e estratégias que levam em consideração os desafios destes novos tempos, as realidades diversas e desiguais do país, e a necessidade de se fazer política com maior participação popular. Tudo junto e misturado, dialogando com a capacidade das juventudes de gerar transformações sistêmicas, sociais e sustentáveis. Revelar a imaginação política que surge das juventudes é vital para garantir a participação social mais consciente nos desafios coletivos que têm pela frente.

A gente precisa ser uma semente, um ponto de referência para uma construção mais ampla.

Matheus Gomes, 31 anos,
vereador eleito em Porto Alegre (RS).

Juventudes No plural

Essa mudança que a gente quer ver, ela tem que se dar na política e não importa muito se a gente gosta ou não.

Tabata Amaral, 28 anos,
deputada estadual eleita, São Paulo (SP

Para entender mais e melhor o contexto das juventudes brasileiras,  contamos com a ajuda de especialistas, a partir de entrevistas informais sobre o tema e a relação com esse novo fenômeno dos jovens na  ocupação do poder.  Conversamos com: Márcio Black (Fundação Tide Setúbal), Marcos Barão (Conjuve), Gabriel Medina (psicólogo, professor e ex-Secretário Nacional da Juventude), Ana Paula Silva (pesquisadora de juventudes urbanas na Flacso), Mariana Resegue (Atlas das Juventudes), Pedro Lacerda (ex-diretor de comunicação do Engajamundo), Juliana Brasil e Celso (Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos). 

O termo “jovens” é uma criança na Constituição Brasileira

Para que se tenha uma noção, o termo “jovem” foi mencionado pela primeira vez somente em 2010, na Constituição Cidadã Brasileira de 1988, a partir da emenda constitucional número 65  . Com isso, começamos a ver um maior engajamento da população jovem para garantir novos temas que não estavam sendo discutidos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que os colocava sob um olhar de tutela. Com essa alteração, conquistada com base em movimentos sociais e estudantis e com o apoio de parlamentares que viram na redemocratização um espaço importante para a garantia da diversidade enquanto um direito humano, os caminhos dos direitos das juventudes começaram a ser reconhecidos e fortalecidos.  Desde as Conferências Nacionais das Juventudes, foi construído o Estatuto da Juventude (falaremos mais dele ali embaixo), que diz que jovens, no Brasil, são pessoas entre 15 e 29 anos, o que complementa e traz novidades importantes para os direitos das juventudes, entre eles os Direitos à Cidadania, à Participação Social e Política e à Representação Juvenil, garantindo também a efetiva inclusão dos jovens nos espaços públicos de decisão, com direito a voz e voto. Nesta pesquisa, utilizamos a idade que o Estatuto traz, ampliando até 34 anos para jovens negros, indígenas e quilombolas, por se tratarem de grupos socialmente marginalizados e com menos representatividade na política institucional e eleitoral. 

Estatuto da Juventude: um passo importante

A participação social e política das juventudes no Brasil foi reconhecida há pouco tempo, exatos oito anos, a partir da construção e da promulgação do Estatuto da Juventude, em 2013.  Como bem escreveu Jéssica Vanessa, ativista dos Direitos Humanos, educadora social e uma das pesquisadoras convidadas a colaborar com esta pesquisa: 

Esse Marco Legal nos mostra que, apesar do jovem ser parte de um grupo considerado muitas vezes como “o futuro do Brasil”, não existia, até o início da última década, o seu lugar de atuação política e social assegurado pelo Estado. A implementação de aparatos institucionais direcionados à juventude foi uma grande conquista. pois assuntos como a organização juvenil, a condição de exclusão do jovem, os efeitos das desigualdades, a violência e os direitos das mulheres jovens passaram a ser pautados como objetos necessários de serem discutidos pelos executivos e legislativos de diferentes níveis.

Por isso, reconhecer a importância dessa construção coletiva é parte fundamental para a participação política das juventudes brasileiras, em suas diversas formas de atuação. 

Além da idade, o tempo e o contexto são contornos importantes

Neste estudo, fomos até as ciências sociais para saber melhor o que é ser jovem e o que os caracteriza. Descobrimos que, aqui, não cabem generalismos ou ideias homogêneas. Pelo contrário, a diversidade de modos de ser é o que distingue essa galera.  Ser jovem, no Brasil, é diferente de ser jovem em Moçambique, por exemplo, e isso influencia também a participação e construção de políticas públicas.  Por isso, adotamos o termo JUVENTUDES, no plural, para enfatizar que esse é um grupo social diverso, com variados modos de ser, em que os marcadores sociais de raça, etnia, gênero, orientação sexual, classe social determinam diferentes desafios para cada um deles. Por conta  de seu tempo e contexto social, as juventudes atuais também são marcadas por momentos como a redemocratização, maior acesso à saúde, educação, consumo e conexão com a internet. Com isso, também há novas demandas e reivindicações, interferências no mundo do trabalho, novos mecanismos de inclusão (e exclusão também), novas formas de ser e expressar-se no mundo a partir de trajetórias não lineares.

Para ser o futuro, é preciso estar vivo!

Atualmente, o Brasil possui quase 25% da população jovem, ou seja, são mais ou menos 48 milhões de pessoas de 15 a 29 anos. Entretanto, a cada 23 minutos um jovem negro é morto no Brasil. Como falar de futuro com essa realidade? É papel de toda a sociedade garantir a existência de jovens historicamente marginalizados. Sem eles e elas, não temos futuro. É urgente combater o genocídio da população negra, pobre e favelada. É urgente combater o genocídio de jovens indígenas e quilombolas, assegurando seus saberes e territórios tradicionais.  É urgente garantir a existência e a sobrevivência dignas de jovens trans, que têm a expectativa de vida de até 35 anos. O futuro da democracia depende de ações efetivas de direito à existência e de políticas públicas que possam dar oportunidades reais e efetivas para essas juventudes.

Juventudes na Política

Ter jovem na política é garantir que esse jovem seja presente na construção de política pública de uma forma que a gente acredita. Que a gente não é só futuro, a gente é realmente presente. Então tendo jovem na política é a certeza de que isso está acontecendo, e que a política passa pela gente também nessa construção. É presente e futuro.

Luma Menezes, 26 anos,
vereadora eleita em Alagoinhas (BA).

Nos últimos anos, presenciamos uma ocupação importante na esfera do poder legislativo por parte dos jovens, assim como por parte das mulheres negras. Desse modo, as juventudes brasileiras também vêm se afirmando dentro do espaço político partidário, sendo este um espaço essencial para a prática política eleitoral. Podemos observar que, entre 2018 e 2021, os jovens foram eleitos por suas grandes lutas coletivas, que interferem na vida de jovens, mas também de toda a sociedade.

Com essa força das juventudes, que pulsa, questiona e transforma os espaços de poder, nasce uma ousadia de renovação e, junto dela, um parlamento cada vez mais diverso, popular e capaz de desburocratizar a política tradicional.